segunda-feira, 9 de julho de 2012

Rio+20, entre Belo Horizonte e Rio de Janeiro: as cidades saíram ganhando

O mês de junho foi movimentado para muita gente, mas os interessados/representantes de cidades foram especialmente solicitados: entre diversos eventos preparatórios e paralelos à Conferencia das Nações Unidas Sobre Desenvolvimento Sustentável, Rio +20, tiveram bastante destaque aqueles voltados para governos locais.

A cidade de Belo Horizonte foi anfitriã do maior congresso mundial do ICLEI-Governos Locais pela Sustentabilidade que, entre os dias 11 e 18 de junho, recebeu mais de 700 convidados internacionais e outros tantos brasileiros, reunindo quase 1500 participantes de governos locais, para discutir sustentabilidade e gestão urbana, a relação entre o global e o local e a economia verde urbana. O Congresso do ICLEI acontece a cada três anos e é sediado por uma de suas cidades membro. Foi a primeira vez que uma cidade da América Latina sediou o Congresso do ICLEI e pode reunir representantes de governos locais com lideranças, pensadores, pesquisadores e estudantes interessados em melhorar a gestão de cidades por meio de ações sustentáveis. Entre os palestrantes estiveram Jeb Brugmann, fundador do ICLEI e especialista em gestão urbana sustentável, o ex-secretário geral do Clube de Roma, Martin Lees, o secretário executivo da Convenção de Diversidade Biológica da ONU, Bráulio Dias e Gil Peñalosa, consultor e diretor da ONG canadense 8-80 Cities.

Além da habitual hospitalidade, BH demonstrou sua liderança na implementação de políticas pela sustentabilidade com a apresentação de experiências como o projeto Vila Viva, a reciclagem e coleta seletiva e a programa de combate ao sedentarismo “Domingo a Rua é Nossa”. O encontro aproveitou a semana anterior à Rio+20 para preparar os governos locais que estariam no Rio de Janeiro participando de atividades paralelas nos diversos locais da conferencia da ONU, com destaque para o Global Town Hall (Prefeitura Global) organizado pelo ICLEI em parceria com o governo do estado do Rio de Janeiro, no Parque dos Atletas, ao lado do Rio Centro, local das negociações oficiais.

Em Belo Horizonte, os participantes tiveram a oportunidade de conhecer as experiências de sucesso realizadas por cidades do mundo todo, em busca da melhora de qualidade de vida para seus habitantes, ao mesmo tempo considerando os desafios da sustentabilidade. Desde o gerenciamento integrado dos resíduos sólidos, até as soluções de transporte urbano, prefeitos e técnicos de governos locais apresentaram soluções inovadoras que poderão inspirar seus pares, mundo afora.

Depois de 20 anos, o Rio de Janeiro sediou novamente um grande encontro internacional sobre desenvolvimento sustentável, que reuniu milhares de pessoas, não apenas os líderes mundiais de governos, mas também formadores de opinião, lideranças empresariais e da sociedade civil organizada. Além do Brasil, a cidade carioca garantiu protagonismo na comunidade internacional, ao sediar inúmeros eventos paralelos, oficiais ou não. O Rio de Janeiro pode demonstrar o sucesso de inúmeras experiências de inclusão social e recuperação de áreas degradadas, além de apresentar a linha do BRT Transoeste, ligando os bairros de Santa Cruz e Barra da Tijuca, já com várias estações em oepração e que estará concluída ainda em 2012.

E aqui vai um (BIG) parêntese: apesar das dificuldades de deslocamento entre os diferentes locais de atividades da Rio+20, foi possível participar de eventos ricos em informação e de encontros memoráveis. Para quem esperava uma grande virada nos rumos do desenvolvimento, a conferencia pode ter sido frustrante. Mas, a verdade é que a proposta da Rio+20 nunca foi equiparar-se à Rio 92, esta sim, um divisor de águas de fato. Além de fazer um balanço do progresso rumo à mudança nos padrões de desenvolvimento nos últimos vinte anos, a contribuição principal da conferencia de 2012 deveria ter sido o fortalecimento de uma abordagem econômica que considerasse aspectos sociais e ambientais nos processos de produção e consumo, de forma a viabilizar as mudanças efetivas necessárias a lidar com os limites do planeta face ao crescimento populacional. Mas isto ficou para depois, já que o documento que resultou da conferencia oficial estabelece a definição de metas do desenvolvimento sustentável até 2015. O documento “O Futuro que Queremos”, com pouco mais de 50 páginas, reafirma, ratifica e reconhece questões e compromissos anteriores, mas não avança e tampouco ousa. Também a questão da governança global para o meio ambiente deixou a desejar: a “reforma” da Comissão de Desenvolvimento Sustentável ficou para depois, com o estabelecimento de um fórum de alto nível que irá discutir qual o melhor modelo de governança para substituí-la eventualmente. Para não dizer que ficou tudo na mesma, decidiu-se que a adesão ao Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) passa a ser universal, o que equivale dizer que agora os países membros da ONU são obrigados a contribuir financeiramente, o que até então era opcional.

Em um ambiente de negociações formais com poucos avanços efetivos entre os governos nacionais, os protagonistas acabaram sendo outros: lideranças empresariais e governos subnacionais apresentaram resultados mensuráveis rumo à sustentabilidade de suas ações, além de assumirem compromissos concretos para lidar com os desafios das mudanças climáticas globais, entre outros. Por força de muita pressão de grupos de atores relevantes, também chamados de partes interessadas (stakeholders), como governos subnacionais, fóruns empresariais, minorias, povos tradicionais, entre outros, o documento dedica alguns parágrafos a reconhecer sua importância e sua contribuição à implementação do desenvolvimento sustentável. É pouco, sim, mas seu papel agora está expresso em um acordo entre as nações, o que confere mandato a esses agentes de transformação em outros fóruns de negociação, inclusive para qualifica-los a financiamento em nível internacional.

Do ponto de vista temático, o de cidades e assentamentos humanos sustentáveis mereceu um espaço no documento, mais uma vez reconhecendo a importância de se promover as redes subnacionais e, por fim, destacando a mobilidade como fator de qualidade de vida nas cidades. Entre tantos outros temas, como florestas, biodiversidade, energia, o de oceanos foi o que recebeu mais atenção, pelo menos em quantidade de texto. Também o tema de produção e consumo obteve reconhecimento e até uma decisão: a adoção no âmbito da ONU do Programa Decenal para Consumo e Produção Sustentáveis.

De resto, os compromissos são voluntários, abertos a todos os grupos de atores relevantes, e sem fonte de recursos definida. Mas alguém esperava mesmo que fosse diferente?

Voltando às cidades, enquanto os participantes se espalhavam pelos quatro cantos do Rio de Janeiro, os representantes de governos locais e interessados em temas urbanos se concentraram em 2 locais: no Forte de Copacabana, onde a prefeitura do Rio de Janeiro e a C40 realizaram um encontro das maiores cidades do mundo (inclusive com a participação de Michael Bloomberg, prefeito de Nova York); e na Barra da Tijuca, no Rio Centro e no Parque dos Atletas, a quase 40 km ao Sul, onde houve, respectivamente, uma série de eventos paralelos em salas do pavilhão principal; e o “Global Town Hall”, organizado pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro em parceria com o ICLEI , com uma série de eventos e oportunidades de encontro para governos locais.

O ponto alto da agenda dos governos locais durante a Rio+20, porém, aconteceu no dia 21, quinta-feira, chamado de “Dia da Liderança das Cidades” (Cities Leadership Day). Vários painéis contaram com a participação de personalidades como a Ministra Ideli Salvatti, Cristiane Filgueires, Secretária Executiva da Convenção do Clima (UNFCCC), do Banco Mundial, Lasse Gustavsson, Diretor Executivo do WWF Mundial, além de diversos prefeitos de várias partes do mundo. Dentre os vários painéis, o mais concorrido foi o da tarde, chamado “Declaração: Liderança pela Sustentabilidade para o Mundo Urbano 2030” (Statement: Sustainability leadership for the urban world 2030), do qual participaram o Secretário Geral da ONU, Ban Ki Moon, os prefeitos de Belo Horizonte, Marcio Lacerda, da Cidade do México, Marcelo Ebrard, e de Durban (África do Sul), James Nxumalo, o Secretário Estadual do Meio Ambiente do Rio de Janeiro Carlos Minc, o diretor do Habitat, Joan Clos e, pelo ICLEI, o presidente do Conselho David Cadman e o Secretário Geral, Konrad Otto-Zimmermann (Por sinal, nenhuma mulher aqui, infelizmente...  e olha que eu sei do cuidado do ICLEI em garantir equilíbrio de gênero em tudo! Vai saber o que houve desta vez).

Na sexta-feira, dia 22 de junho, encerraram-se as atividades oficiais da Rio+20 e, na Prefeitura Global, as cidades puderam participar de debates e oficinas mais técnicos, sobre planejamento urbano integrado, economia urbana verde e liderança das cidades na promoção do desenvolvimento sustentável. As discussões resultaram em um documento de recomendações aos governos nacionais encaminhado ao Secretariado da Rio+20 e que será disseminado nas redes internacionais.

Agora, para os governos nacionais, é esperar para ver, mas para as cidades, é mais “mãos à obra”.

http://local2012.iclei.org/iclei-and-rio-20/
http://issuu.com/prefeituradebh/docs/dom_20120615?mode=window&viewMode=singlePage
http://www.rio20.gov.br/documentos/documentos-da-conferencia/o-futuro-que-queremos/

quarta-feira, 27 de junho de 2012

A força do costume...

“Político é tudo ladrão”; “Rouba, mas faz”, “Faça um político trabalhar: não o reeleja”.  É com esse tipo de bordão que se revela a percepção do público em geral sobre a classe política brasileira. E se existe base factual para fundamentar algumas dessas percepções, muitas são as vítimas inocentes daqueles que se aproveitam da parcela sensacionalista da imprensa, mais preocupada em julgar a priori do que informar os fatos. Leva-se uma vida inteira para se construir uma reputação e apenas segundos para se colocá-la sob suspeita, quando não destruí-la irremediavelmente. E nesse processo faltam respeito, civilidade e ética, não apenas informação.

Nisso tudo, quem mais perde é o cidadão, já cansado das mazelas políticas no país, sem saber o que tem procedência ou não, sem informação qualificada para poder discernir entre o mau e o bom político. E aí, recorre-se aos chavões, que em alguns casos até têm algum fundamento. O fato é que muita gente mal intencionada se prevalece da desinformação, da falta de interesse do eleitor e da saturação de escândalos para jogar todos na mesma vala e confundir o público.... E quem ganha com isso? Quem não tem nada a perder, pois não está preocupado com a opinião pública, já que seus ganhos estão em outras fontes, depois de vencidas as eleições com as armas do “vale tudo”.

A exemplo do que já aconteceu outras vezes, estamos assistindo a tentativa de assassinato político de uma das figuras mais emblemáticas da vida pública em São Paulo: o Dr. Eduardo Jorge Martins Alves Sobrinho – doutor sim, pois é médico sanitarista – que está sendo acusado de receber suborno para beneficiar o Shopping Pátio Higienópolis. Digo ”tentativa”, pois estou segura de que a verdade prevalecerá e Eduardo Jorge terá sua reputação reestabelecida; embora, infelizmente, depois de muito sofrimento.

Não terá sido a primeira vez que procuram atingi-lo. No ano passado, aproveitando-se de dificuldades operacionais com a empresa responsável pelo programa de inspeção e manutenção veicular, fizeram alarde em relação ao contrato, imputando-lhe conduta duvidosa, quando na verdade tratava-se de questões processuais burocráticas iniciadas em gestão anterior e que a ele se relacionavam em função do cargo. Nada disso, porém, baseia-se em mais do que interpretação tendenciosa dos meandros processuais na administração pública, completamente incompreensíveis para o comum dos mortais, ou em acusações ocas, obtidas em depoimentos de pessoas cuja credibilidade pouco se conhece, para dizer o mínimo.
Nesse caso do shopping Pátio Higienópolis, com base no que tem sido noticiado, o que o leitor desavisado pode depreender? Vejamos. Uma pessoa, aqui chamada de “Testemunha D” como quis o Ministério Público, é ouvida em depoimento pelo promotor, sobre suposto esquema de suborno promovido no âmbito da Prefeitura de São Paulo, pelo diretor do departamento de aprovação. Até aí, dá para acompanhar.

A seguir, a matéria continua relatando que, no depoimento, a “Testemunha D” diz (diz?!?!?) ter participado em 2009 de reuniões (onde?) em que “ouviu o nome” do Secretário Eduardo Jorge mencionado (por quem, mesmo?) como sendo a pessoa que receberia parte da propina. A referida “Testemunha D” não declara ter estado com o Secretário ou alguém autorizado por ele, mas “diz” que um terceiro – que por sinal também nega essa afirmação - seria encarregado na sua firma (por quem, novamente?) a entregar o dinheiro pessoalmente ao Dr. Eduardo. Segundo a dita cuja, ela teria sido demitida da empresa por questionar seus superiores sobre esse esquema de corrupção. Tudo isso tem sido desmentido por outros envolvidos. A empresa, por sua vez, declara que a ex-funcionária foi demitida em abril de 2011 por malversação dos recursos da empresa, a qual está processando na Justiça do Trabalho... e por aí vai, mas para nós, isso não interessa de fato. 
Enfim, quanto à credibilidade das afirmações – não da pessoa -, precisa dizer mais alguma coisa? E isso é matéria pra jornalismo sério? Onde está a responsabilidade do jornal?

Quem sabe como foi o processo de Watergate que levou ao “impeachment” de Nixon nos EUA, sente saudades do jornalismo investigativo de qualidade...

sábado, 25 de fevereiro de 2012

AÇÃO LOCAL NA VANGUARDA DA PROTEÇÃO AO CLIMA

Por Laura Valente de Macedo*
 Passada a primeira década do novo milênio, praticamente não existe controvérsia em relação à influência das ati­vi­da­des huma­nas sobre as recentes mudan­ças no sis­te­ma cli­máti­co da Terra. Depois de 20 anos, os relatórios científicos cada vez mais precisos do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC)[1], corroboram a teoria de aquecimento global de origem antropogênica. A partir de 2007, o tema ganhou espaço na grande mídia e passou a frequentar as páginas do noticiário econômico mundial, além de telas de cinema e palcos de teatro pelo mundo afora[2].

O processo político internacional deflagrado duran­te a Rio-92[3] com a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (­UNFCCC) e, subsidiado pelo primeiro relatório do IPCC de 1990, progressivamente assumiu um caráter de urgência a cada novo relatório científico. Os registros de elevação recorde das temperaturas médias nos anos 1990 e os eventos extremos cada vez mais intensos e freqüentes - assim como as imagens do derretimento das calotas polares e de incêndios florestais em regiões temperadas, entre outras - acrescentaram substância à tese do aquecimento global. Tornou-se cada vez mais evidente que os compromissos iniciais para a redução de gases de efeito estufa (GEE) propostos nos tratados internacionais seriam insuficientes para reverter o quadro.

O IPCC tem feito rela­tos minu­cio­sos sobre os impac­tos ambien­tais, ­sociais e econômicos da mudança do clima. Os custos serão maio­res para os países ­pobres, sem recur­sos finan­cei­ros e capacida­de téc­ni­ca para fazer face aos danos. Áreas costeiras são particularmente vulneráveis, não apenas à elevação do nível do mar, mas também aos eventos extremos. Tem­pes­ta­des tro­pi­cais, furacões, inun­da­ções, assim como ondas de calor e secas estão ocorrendo com inten­si­da­de e frequên­cia cada vez maiores. Uma análi­se recente de eventos extremos ocor­ri­dos a par­tir de 1980 reve­la que estes tri­pli­ca­ram no período entre janeiro e agosto de 2010 em relação àquele ano, assim como os custos financeiros, segundo dados divulgados pela companhia de seguros alemã Munich Re[4].

Ao mesmo tempo, a responsabilização dos diferentes atores sociais tornou-se mais objetiva e, embora as nego­cia­ções sobre mudan­ças cli­máti­cas sejam rea­li­za­das no âmbito de nações, cientistas e toma­do­res de deci­são reco­nhe­ceram a neces­si­da­de premente de mobilizar o conjunto da sociedade no enfrentamento ao problema. Já não se trata mais apenas de cumprir acordos formais, mas de promover um esforço efetivo pela mudança radical do padrão de desenvolvimento baseado na queima de combustíveis fósseis.

Dentre os atores relevantes, governos locais merecem destaque. Além da vulnerabilidade às mudanças do clima - uma vez que os impactos em áreas urbanas são potencializados, atingindo infraestrutura viária e sistemas de abastecimento e saúde pública, por exemplo - existem inúme­ras razões para que pre­fei­tu­ras, departamen­tos muni­ci­pais, admi­nis­tra­ções dis­tri­tais e metro­po­li­ta­nas se enga­jem efe­ti­va­men­te nessa luta con­tra as con­se­quên­cias do aque­ci­men­to glo­bal. Bastaria considerar alguns núme­ros: segun­do a ONU, já em 2007, a popu­la­ção urbana da Terra ultrapassou a rural; na América Latina, são em média 76,2% (PNUD, 2004) e, no Brasil, cerca de 80%. Cidades consomem dois terços da energia do planeta e emitem 70% das emissões de CO2. Nesse planeta cada vez mais urbanizado e frágil, o papel de gestores urbanos é crucial para integrar os esforços de forma efetiva.

As cidades têm liderado cada vez mais a ação climática que exige políticas públicas adequadas para implementação de medidas, tanto de mitigação como de adaptação. Cidades têm um papel estra­tégi­co para a redu­ção de emis­sões de GEE, por sua capacidade de dis­se­mi­na­ção de informações, além de poder de ação e agilidade. São ainda laboratórios dinâmicos para testar as inovações tecnológicas que impulsionarão a “economia verde” necessária ao desen­vol­vi­men­to susten­tável. Nessa transição, as cidades devem dar o exemplo por meio de uma ges­tão urba­na res­pon­sável e efi­cien­te no controle de sua “pegada de carbono”[5], ao mesmo tempo em que melho­ram a qua­li­da­de de vida dos cidadãos.

Cientes de sua responsabilidade e capacidade, autoridades municipais têm se mobilizado, participando de redes, assumindo compromissos públicos em nível internacional e promovendo ações audaciosas para mitigar e se adaptar aos impactos inevitáveis das mudanças climáticas. Revelando ter uma visão que vai além de seus man­da­tos, muitos pre­fei­tos colocaram-se na lide­ran­ça mundial ao esta­be­le­cer metas e pro­mo­ver ações que efe­ti­va­men­te con­tri­buam para redu­zir as emis­sões das ati­vi­da­des urba­nas gera­do­ras dos GEE, como uso de ener­gia, geren­cia­men­to de trans­por­te e ges­tão de resíduos sóli­dos domés­ti­cos.

Em 1988, a cida­de canadense de Toronto foi o pri­mei­ro gover­no a esta­be­le­cer meta de 20% de redu­ção de GEE até 2005, demons­tran­do que era pos­sível diminuir o consumo de energia de fontes fósseis sem pre­juízo para o desen­vol­vi­men­to, obtendo redu­ções da ordem de 40% em suas ope­ra­ções muni­ci­pais em 2004. Nos vinte anos que se seguiram, mui­tos ­outros governos locais imple­men­taram políticas e medi­das nesse sen­ti­do, ao ade­ri­rem à cam­pa­nha inter­na­cio­nal Cidades Pela Proteção do Clima – CCP , iniciativa da organização Governos Locais pela Sustentabilidade (ICLEI)[6].

A campanha CCP foi pioneira e sua rede continua atuante[7], mas várias outras iniciativas de governos locais e estaduais estão em curso para promover a proteção climática, inclusive no Brasil. Em 2009, o ICLEI lançou, em parceria com a  cidade  de Copenhague, um catálogo de iniciativas locais com mais de 3.000 exemplos de compromissos voluntários e ações pelo clima[8].  Uma rede internacional das 40 maiores cidades do mundo, a C40, fundada em Londres em 2005, tem promovido as iniciativas de suas associadas para reduzir sua “pegada de carbono” com foco no estabelecimento de parcerias publico-privadas articuladas pela Fundação Clinton.

Nova York, a metrópole mundial, lançou um plano audacioso para reduzir suas emissões em 2007 (PlaNYC), atualizado em abril de 2011. Das 127 iniciativas propostas no plano original, praticamente todas foram implementadas até o final de 2009 e cerca de dois terços das metas foram alcançadas no mesmo período, resultando em 13% a menos de emissões de GEE relativamente a 2005. A prefeitura aliou a busca pela redução de emissões à preocupação com qualidade de vida local, focando na ampliação da área verde da cidade e investindo na melhoria de edifícios com medidas de eficiência energética.

Em novembro de 2010, o pre­fei­to da Cidade do México convocou as cidades do mundo todo para firmarem um acordo em sintonia com as negociações internacionais, em encontro que antecedeu a COP16[9], realizada em dezembro de 2010.  As 138 lideranças locais que aderiram ao Pacto da Cidade do México[10] não apenas se comprometeram a atingir metas de redução, como também a manter as informações atualizadas em um banco de dados aberto à verificação sobre os resultados obtidos[11]. Em maio de 2011 já havia mais de 180 signatários do pacto.

Essa mobilização repercutiu também na comunidade internacional.  O movimento mundial de governos locais, que culminou em uma iniciativa liderada pelo ICLEI chamada de “Local Government Roadmap”[12], lançada em Bali, durante a COP13 em dezembro de 2008, pleiteava o reconhecimento oficial pelas nações de seu papel na implementação dos compromissos internacionais, a exemplo do que havia ocorrido no início de 2008, no âmbito da Convenção de Biodiversidade (CBD)[13]. O Secretariado da Convenção do Clima da ONU finalmente reconheceu os governos locais como atores relevantes no documento oficial resultante da COP16.

Das cida­des em países do Anexo I, além de Nova York des­ta­cam-se algu­mas que têm pro­mo­vi­do ações exem­pla­res, seguin­do os pas­sos de Toronto. A pre­fei­tu­ra de Chicago implementou um projeto de iluminação pública com LED (diodos emissores de luz), entre 2004 e 2009, alcançando mais de 85% de economia no uso de energia, o que significou menos 7,97 mil tonCO2e e US$ 2,4 milhões por ano para os cofres da prefeitura.

Do outro lado do Oceano Atlântico, Copenhague, Paris e Barcelona implementam programas para aumentar o uso de bicicleta como opção de transporte, com enorme sucesso. A estratégia é dar ênfase à mobilidade, segurança e saúde inerentes a esse meio de locomoção, quando comparado ao uso do automóvel. A opção por medidas mais duras, como o pedágio urbano também tem surtido efeito. Em Londres, em 2008, houve uma redução de 16% das emissões, 100 mil tonCO2. A cobrança da taxa de congestionamento na capital inglesa retirou cerca de 75.000 veículos da área central no esquema iniciado em 2003. Em menos de dois anos a cidade recuperou o investimento inicial de 160 mil libras esterlinas com a receita do pedágio que tem sido investida principalmente em melhoria do transporte público. Em 2005, o valor do pedágio passou de 5 para 8 libras esterlinas e, em 2007, a área de restrição aumentou em 50%.

No Brasil, cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Curitiba também acompanham o passo das líderes mundiais. Realizaram seus inventários de emissões e implementaram diversas medidas para reduzir emissões de GEE. As  medidas incluem desde legislação e planos, até ações concretas, como aumentar suas áreas verdes, importantes sumidouros de carbono, e transformar em energia o biogás de aterros sanitários.

A lista de cidades e suas ações é exten­sa, e continua sendo atualizada constantemente. O impor­tan­te é que a ideia se espa­lhe e que os cida­dãos, a exem­plo de seus líde­res muni­ci­pais, con­tri­buam no esfor­ço mun­dial de proteção ao clima e à atmosfera da Terra, que, afi­nal, também é um bem comum insubs­ti­tuível.


* Este texto reproduz parcialmente o capítulo de mesmo nome da  autora, publicado em (2012) Trigueiro, A. , C. Guimarães, D. Mateus et al,  Mundo Sustentável 2, Rio de Janeiro: Editora Globo (397pp)


[1] O IPCC, fundado em 1988 pela Organização Mundial de Meteorologia (OMM) em parceria com o Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas (PNUMA) é composto por cerca de 2500 cientistas do mundo todo, que fazem um levantamento global do estado da arte da ciência sobre o clima. Em 2008, o IV Relatório do IPCC venceu o Prémio Nobel da Paz, juntamente com Al Gore Jr., por seu trabalho de divulgação do tema de mudanças climáticas.
[2] O filme de Al Gore Jr, “Uma Verdade Inconveniente” de 2007Acao_Loc_LVM_Trig_2011 também venceu o Oscar de melhor documentário em 2008.  Outros filmes como “The Age of Stupid” e  “Eleventh Hour” continuam a fazer sucesso no You Tube. No início de 2011, estrearam 2 espetáculos teatrais em Londres sobre o assunto – “Greenland” e “The Heretic”.
[3] A Conferencia das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento - CNUMAD (UNCED, da sigla em inglês), realizada no Rio de Janeiro em junho de 1992, também conhecida como Eco 92.
[5] Ver boxe: “pegada Ecológica”, no capítulo “Consumo Consciente”.
[6] As cida­des CCP cum­prem uma metodo­lo­gia sim­ples de ava­lia­ção de desem­pe­nho, pela qual rea­li­zam um inven­tário de suas emis­sões de GEE (uti­li­zan­do um soft­wa­re espe­cífi­co basea­do nas dire­tri­zes do IPCC), estabele­cem metas, ela­bo­ram planos de ação cli­máti­ca local e imple­men­tam medidas, moni­to­ran­do e ava­lian­do o pro­gres­so perio­di­ca­men­te.
[7] A Cam­pa­nha CCP, lan­ça­da em 1993 com 14 cida­des, che­gou a 2010 com mais de 1000 mem­bros .
[8] Site do http://www.climate-catalogue.org/
[9] A Conferência das Partes à Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP - UNFCCC) é o principal evento político internacional sobre clima, que ocorre todos os anos desde 1995 e discute a implementação da convenção e seus acordos. A décima sexta conferencia das partes (COP16) foi realizada em Cancun, no México.
[10] Para ver o texto e aderir ao pacto, acessar o site www.iclei.org/climate-roadmap
[11] Centro de referencia sobre clima e cidades do ICLEI - http://carbonn.org/
[12] O Mapa do Caminho dos Governos Locais, de Bali, a Poznan a Copenhague foi um programa liderado pelo ICLEI, reunindo associações mundiais de governos locais e em parceria com redes subnacionais, como a NRG4SD, que reivindicava o reconhecimento de seu papel como atores relevantes nos documentos oficiais, de maneira a validar suas ações, e, com isso qualificar esses governos a receber financiamento para suas iniciativas de mitigação e adaptação no âmbito da UNFCCC.
[13] A Oitava Conferencia das Partes da Convenção de Biodiversidade (COP8-COB) realizada em Curitiba, em 2008 incluiu no seu texto oficial uma menção aos governos locais como atores relevantes na implementação dos compromissos da CBD.