segunda-feira, 9 de julho de 2012

Rio+20, entre Belo Horizonte e Rio de Janeiro: as cidades saíram ganhando

O mês de junho foi movimentado para muita gente, mas os interessados/representantes de cidades foram especialmente solicitados: entre diversos eventos preparatórios e paralelos à Conferencia das Nações Unidas Sobre Desenvolvimento Sustentável, Rio +20, tiveram bastante destaque aqueles voltados para governos locais.

A cidade de Belo Horizonte foi anfitriã do maior congresso mundial do ICLEI-Governos Locais pela Sustentabilidade que, entre os dias 11 e 18 de junho, recebeu mais de 700 convidados internacionais e outros tantos brasileiros, reunindo quase 1500 participantes de governos locais, para discutir sustentabilidade e gestão urbana, a relação entre o global e o local e a economia verde urbana. O Congresso do ICLEI acontece a cada três anos e é sediado por uma de suas cidades membro. Foi a primeira vez que uma cidade da América Latina sediou o Congresso do ICLEI e pode reunir representantes de governos locais com lideranças, pensadores, pesquisadores e estudantes interessados em melhorar a gestão de cidades por meio de ações sustentáveis. Entre os palestrantes estiveram Jeb Brugmann, fundador do ICLEI e especialista em gestão urbana sustentável, o ex-secretário geral do Clube de Roma, Martin Lees, o secretário executivo da Convenção de Diversidade Biológica da ONU, Bráulio Dias e Gil Peñalosa, consultor e diretor da ONG canadense 8-80 Cities.

Além da habitual hospitalidade, BH demonstrou sua liderança na implementação de políticas pela sustentabilidade com a apresentação de experiências como o projeto Vila Viva, a reciclagem e coleta seletiva e a programa de combate ao sedentarismo “Domingo a Rua é Nossa”. O encontro aproveitou a semana anterior à Rio+20 para preparar os governos locais que estariam no Rio de Janeiro participando de atividades paralelas nos diversos locais da conferencia da ONU, com destaque para o Global Town Hall (Prefeitura Global) organizado pelo ICLEI em parceria com o governo do estado do Rio de Janeiro, no Parque dos Atletas, ao lado do Rio Centro, local das negociações oficiais.

Em Belo Horizonte, os participantes tiveram a oportunidade de conhecer as experiências de sucesso realizadas por cidades do mundo todo, em busca da melhora de qualidade de vida para seus habitantes, ao mesmo tempo considerando os desafios da sustentabilidade. Desde o gerenciamento integrado dos resíduos sólidos, até as soluções de transporte urbano, prefeitos e técnicos de governos locais apresentaram soluções inovadoras que poderão inspirar seus pares, mundo afora.

Depois de 20 anos, o Rio de Janeiro sediou novamente um grande encontro internacional sobre desenvolvimento sustentável, que reuniu milhares de pessoas, não apenas os líderes mundiais de governos, mas também formadores de opinião, lideranças empresariais e da sociedade civil organizada. Além do Brasil, a cidade carioca garantiu protagonismo na comunidade internacional, ao sediar inúmeros eventos paralelos, oficiais ou não. O Rio de Janeiro pode demonstrar o sucesso de inúmeras experiências de inclusão social e recuperação de áreas degradadas, além de apresentar a linha do BRT Transoeste, ligando os bairros de Santa Cruz e Barra da Tijuca, já com várias estações em oepração e que estará concluída ainda em 2012.

E aqui vai um (BIG) parêntese: apesar das dificuldades de deslocamento entre os diferentes locais de atividades da Rio+20, foi possível participar de eventos ricos em informação e de encontros memoráveis. Para quem esperava uma grande virada nos rumos do desenvolvimento, a conferencia pode ter sido frustrante. Mas, a verdade é que a proposta da Rio+20 nunca foi equiparar-se à Rio 92, esta sim, um divisor de águas de fato. Além de fazer um balanço do progresso rumo à mudança nos padrões de desenvolvimento nos últimos vinte anos, a contribuição principal da conferencia de 2012 deveria ter sido o fortalecimento de uma abordagem econômica que considerasse aspectos sociais e ambientais nos processos de produção e consumo, de forma a viabilizar as mudanças efetivas necessárias a lidar com os limites do planeta face ao crescimento populacional. Mas isto ficou para depois, já que o documento que resultou da conferencia oficial estabelece a definição de metas do desenvolvimento sustentável até 2015. O documento “O Futuro que Queremos”, com pouco mais de 50 páginas, reafirma, ratifica e reconhece questões e compromissos anteriores, mas não avança e tampouco ousa. Também a questão da governança global para o meio ambiente deixou a desejar: a “reforma” da Comissão de Desenvolvimento Sustentável ficou para depois, com o estabelecimento de um fórum de alto nível que irá discutir qual o melhor modelo de governança para substituí-la eventualmente. Para não dizer que ficou tudo na mesma, decidiu-se que a adesão ao Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) passa a ser universal, o que equivale dizer que agora os países membros da ONU são obrigados a contribuir financeiramente, o que até então era opcional.

Em um ambiente de negociações formais com poucos avanços efetivos entre os governos nacionais, os protagonistas acabaram sendo outros: lideranças empresariais e governos subnacionais apresentaram resultados mensuráveis rumo à sustentabilidade de suas ações, além de assumirem compromissos concretos para lidar com os desafios das mudanças climáticas globais, entre outros. Por força de muita pressão de grupos de atores relevantes, também chamados de partes interessadas (stakeholders), como governos subnacionais, fóruns empresariais, minorias, povos tradicionais, entre outros, o documento dedica alguns parágrafos a reconhecer sua importância e sua contribuição à implementação do desenvolvimento sustentável. É pouco, sim, mas seu papel agora está expresso em um acordo entre as nações, o que confere mandato a esses agentes de transformação em outros fóruns de negociação, inclusive para qualifica-los a financiamento em nível internacional.

Do ponto de vista temático, o de cidades e assentamentos humanos sustentáveis mereceu um espaço no documento, mais uma vez reconhecendo a importância de se promover as redes subnacionais e, por fim, destacando a mobilidade como fator de qualidade de vida nas cidades. Entre tantos outros temas, como florestas, biodiversidade, energia, o de oceanos foi o que recebeu mais atenção, pelo menos em quantidade de texto. Também o tema de produção e consumo obteve reconhecimento e até uma decisão: a adoção no âmbito da ONU do Programa Decenal para Consumo e Produção Sustentáveis.

De resto, os compromissos são voluntários, abertos a todos os grupos de atores relevantes, e sem fonte de recursos definida. Mas alguém esperava mesmo que fosse diferente?

Voltando às cidades, enquanto os participantes se espalhavam pelos quatro cantos do Rio de Janeiro, os representantes de governos locais e interessados em temas urbanos se concentraram em 2 locais: no Forte de Copacabana, onde a prefeitura do Rio de Janeiro e a C40 realizaram um encontro das maiores cidades do mundo (inclusive com a participação de Michael Bloomberg, prefeito de Nova York); e na Barra da Tijuca, no Rio Centro e no Parque dos Atletas, a quase 40 km ao Sul, onde houve, respectivamente, uma série de eventos paralelos em salas do pavilhão principal; e o “Global Town Hall”, organizado pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro em parceria com o ICLEI , com uma série de eventos e oportunidades de encontro para governos locais.

O ponto alto da agenda dos governos locais durante a Rio+20, porém, aconteceu no dia 21, quinta-feira, chamado de “Dia da Liderança das Cidades” (Cities Leadership Day). Vários painéis contaram com a participação de personalidades como a Ministra Ideli Salvatti, Cristiane Filgueires, Secretária Executiva da Convenção do Clima (UNFCCC), do Banco Mundial, Lasse Gustavsson, Diretor Executivo do WWF Mundial, além de diversos prefeitos de várias partes do mundo. Dentre os vários painéis, o mais concorrido foi o da tarde, chamado “Declaração: Liderança pela Sustentabilidade para o Mundo Urbano 2030” (Statement: Sustainability leadership for the urban world 2030), do qual participaram o Secretário Geral da ONU, Ban Ki Moon, os prefeitos de Belo Horizonte, Marcio Lacerda, da Cidade do México, Marcelo Ebrard, e de Durban (África do Sul), James Nxumalo, o Secretário Estadual do Meio Ambiente do Rio de Janeiro Carlos Minc, o diretor do Habitat, Joan Clos e, pelo ICLEI, o presidente do Conselho David Cadman e o Secretário Geral, Konrad Otto-Zimmermann (Por sinal, nenhuma mulher aqui, infelizmente...  e olha que eu sei do cuidado do ICLEI em garantir equilíbrio de gênero em tudo! Vai saber o que houve desta vez).

Na sexta-feira, dia 22 de junho, encerraram-se as atividades oficiais da Rio+20 e, na Prefeitura Global, as cidades puderam participar de debates e oficinas mais técnicos, sobre planejamento urbano integrado, economia urbana verde e liderança das cidades na promoção do desenvolvimento sustentável. As discussões resultaram em um documento de recomendações aos governos nacionais encaminhado ao Secretariado da Rio+20 e que será disseminado nas redes internacionais.

Agora, para os governos nacionais, é esperar para ver, mas para as cidades, é mais “mãos à obra”.

http://local2012.iclei.org/iclei-and-rio-20/
http://issuu.com/prefeituradebh/docs/dom_20120615?mode=window&viewMode=singlePage
http://www.rio20.gov.br/documentos/documentos-da-conferencia/o-futuro-que-queremos/